Fotografia



Ornamentação, arquitetura e urbanismo republicanos em Belo Horizonte

Município de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil



© Frederico de Paula Tofani


Frontões, empenas e tímpanos...

Platibandas, acrotérios e balaústres...

Estatuetas, compoteiras, pináculos e pinhas...

Medalhões, escudos, estampas, epígrafes, festões e palmetas...

Cornijas, cimalhas, lacrimais, dentículos, sófitos e lambrequins...

Abóbadas, torreões, áticos, telhados-de-mansarda e achalezados...

Colunatas jônicas, dóricas e coríntias...

Vergas e sobrevergas ogivais, triangulares e plenas...

Portadas, janelões, bandeiras, seteiras, balcões e gradis bordados em ferro...

Escadas, escadarias, pedestais, embasamentos e porões altos...

Mármores italianos, cristais belgas, metais ingleses e telhas francesas...


Elementos da arquitetura de uma sociedade que se despedia de sua tradição colonial, buscava se inscrever em uma modernidade urbana e industrial e ansiava por consolidar um ethos europeu nos trópicos. Ingredientes de uma estética pautada por historicismos, estilismos e ecletismos; ora acusada de “cacofônica” e “vazia de significação”, ora celebrada como uma potente expressão do anseio iluminista oitocentista. Componentes do corpus de uma nova urbanidade assentada sobre os princípios de Liberté, Égalité e Fraternité e de uma cidade concebida como símbolo do ideário da nascente república brasileira. Enfim, partes constitutivas da nova capital de Minas Gerais: Belo Horizonte.


Uma malha de ruas a 90° sobreposta por uma malha de avenidas a 45° cunha a Zona Urbana da Belo Horizonte de Aarão Reis e Américo Macedo e funda uma “Cidade das Esquinas” pautada pela racionalidade positivista. Essa superposição é circunscrita e contida pela Avenida do Contorno: senhora de curvas caprichosas e que separa a cidade em territorialidades urbanas e suburbanas. Nela nos esquecemos do rigor das retas e ângulos por ela limitada, mas somos lembrados que a cidade se configurou, desde o seu nascedouro, como um espaço de contradições e exclusão, como um corpo onde centralidades e periferias hora se negam, hora se retroalimentam, numa dialética onde o verdadeiro senhor não parece ser a República.


Nesse traçado urbano (bem como na arquitetura e ornamentação eclética) predomina a intertextualidade: três textos, três origens. Misto do iron grid da tradição urbanística norte-americana, com a monumentalidade neoclássica haussmanniana e com a lógica dos anéis defensivos das cidades medievais europeias. Mas nada de baixas do sapateiro, largos da forca e ruas direitas. As peculiaridades locais perdem relevância e as toponímias agora nos remetem à imensidão do território e à suposta grandeza da história nacional. Agora, vai-se do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte (e mais além) cruzando-se, com cadenciada regularidade, por heroicos inconfidentes e bons selvagens tão caros à historiografia republicana.


Dentro desse anel, o traçado urbano não induz o olhar a apenas descobrir as arquiteturas onde os poderes republicanos se encontram materializados, mas também nos convida a acompanhar o curso do sol, da lua e das estrelas. Ele revela a gigantesca abóbada celeste que nos protege e que integra – como em nosso “lábaro estrelado” – todos os Estados da Federação. Essa paisagem de caráter predominantemente cósmico, mesmo que contida ao rés-do-chão pela Avenida do Contorno, consegue escapar rumo ao norte e estabelecer uma perspectiva do longínquo que nos convida a descer o Rio das Velhas, se deixar levar pelo Velho Chico, fazer o grande sertão e resgatar o mar.


Esse movimento encontra o seu contraponto na muralha que se ergue ao sul: a Serra do Curral, limite que nem o gado valente que vinha da Bahia ousava cruzar. Ela se ergue como uma guardiã que zela pelos homens do sertão e pelos homens das montanhas. Montanhas essas que não vemos, mas que habitam a geografia de nossas memórias; memórias ancestrais dos tempos de Vila Rica.


Belo Horizonte é dual, contraditória, no meio... A gente nunca sabe... Mas é um belo horizonte de onde emergem, com as primeiras luzes da manhã, as promessas que as luzes do fim-de-tarde deixarão para amanhã. A nossa cidade é construída para a luz, da luz, de luz. Aquela luz intensa, de um azul profundo, que só existe nos campos altos do sertão e que funda nos objetos um jogo de claros e sombras de duro contraste. Esse jogo só cessa quando a noite tenta encobrir a cidade, mas é derrotada pelo rendilhado prateado, tecido rapidamente pelo ziguezague dos postes a despertar. Pensando bem, esse jogo não cessa não; ele apenas se transforma e revela – especialmente nas noites de magnólias – os fantasmas de culpas não extirpadas, perversidades deixadas impunes e sonhos não realizados. Os mais antigos vagam há mais de 100 anos e, segundo se jura por aqui, eles te suplicam, com um olhar exausto e comovente, por um auxílio que os permita encontrar certa rua ou praça – do Arraial de Curral del Rey.


Belo Horizonte é assim: um corpo polimorfo com um coração geométrico, caprichosamente incrustada na fronteira entre vários duplos: sertão e montanha, passado e futuro, ideal e real, centro e periferia, fuga e retorno, grelha e ornamento. E se você for seduzido por suas avenidas, ruas e esquinas iluminadas, você descobrirá os seus edifícios republicanos; e em algum lugar entre as figuras antropomórficas, zoomórficas e fitomórficas que os ornam, você poderá encontrar um pequeno mapa do Brasil ou de Minas Gerais. Chegue mais perto e olhe ainda mais cuidadosamente, pois, com um pouco de sorte, você encontrará neles a cidade de Belo Horizonte; e em Belo Horizonte, em uma avenida, rua ou esquina iluminada, você certamente se deparará com:


Frontões, empenas e tímpanos...

Platibandas, acrotérios e balaústres...

Estatuetas, compoteiras, pináculos e pinhas...

Medalhões, escudos, estampas, epígrafes, festões e palmetas...

Cornijas, cimalhas, lacrimais, dentículos, sófitos e lambrequins...

Abóbadas, torreões, áticos, telhados-de-mansarda e achalezados...

Colunatas jônicas, dóricas e coríntias...

Vergas e sobrevergas ogivais, triangulares e plenas...

Portadas, janelões, bandeiras, seteiras, balcões e gradis bordados em ferro...

Escadas, escadarias, pedestais, embasamentos e porões altos...

Mármores italianos, cristais belgas, metais ingleses e telhas francesas...



Frederico de Paula Tofani

Em breve, mais fotografias!

Referências

Vinculações

Agradecimentos

Este acervo fotográfico foi produzido com o apoio de:

Escola de Arquitetura da UFMG

Profa. Heloísa Maria Murgel Starling

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